NVMe-oF TCP vs RoCE: Análise Pragmática de Performance e Deploy em 2025

      17 de dezembro de 2025 Priya Patel 8 min de leitura
      NVMe-oF TCP vs RoCE: Análise Pragmática de Performance e Deploy em 2025

      Pare de configurar PFC cegamente. Analisamos os trade-offs reais entre NVMe/TCP e RoCEv2: latência, overhead de CPU e a complexidade de redes 'lossless' em 2025.

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      Como investigador forense de sistemas, já vi datacenters inteiros paralisados não por falha de hardware, mas por excesso de otimização. O cenário é clássico: um arquiteto lê sobre "latência de nanossegundos", implementa RDMA (Remote Direct Memory Access) sem entender a física da rede e, seis meses depois, sou chamado para descobrir por que o banco de dados principal trava aleatoriamente às terças-feiras.

      Em 2025, a batalha pelo transporte de armazenamento NVMe over Fabrics (NVMe-oF) não é mais sobre quem tem o número mais baixo no benchmark de marketing. É uma escolha entre a fragilidade de alto desempenho do RoCE (RDMA over Converged Ethernet) e a resiliência evoluída do NVMe/TCP. Vamos dissecar essa infraestrutura, começando pelos sintomas e indo até a causa raiz.

      O que é NVMe-oF e como escolher o transporte? NVMe over Fabrics (NVMe-oF) é a especificação que estende a eficiência do protocolo NVMe local para redes de armazenamento. A escolha do transporte define a estabilidade: RoCE (v2) utiliza RDMA para latência ultra-baixa e bypass de CPU, exigindo uma rede Ethernet "lossless" (sem perdas) complexa de gerenciar. NVMe/TCP utiliza a pilha TCP/IP padrão, oferecendo desempenho próximo ao RDMA com hardware moderno (SmartNICs), mas priorizando a compatibilidade e a tolerância a falhas da rede existente.


      O Mito da "Latência Zero" e a Realidade do RoCE

      O hype do RDMA é construído sobre uma promessa sedutora: mover dados da memória de um servidor para a memória de outro sem acordar a CPU. Na teoria, isso elimina o overhead do sistema operacional. Na prática forense, isso remove a camada de proteção que o Kernel oferece.

      Quando analisamos um trace de IO quebrado em um ambiente RoCE, o que vemos não é lentidão, é ausência. O RoCE v2 encapsula pacotes InfiniBand dentro de UDP. Para que isso funcione com a performance prometida, a placa de rede (NIC) precisa saber exatamente onde colocar os dados na memória RAM do destino.

      O Caminho dos Dados: Onde o RoCE ganha tempo (bypass de Kernel) e onde o TCP gastava ciclos (cópias de buffer). Figura: O Caminho dos Dados: Onde o RoCE ganha tempo (bypass de Kernel) e onde o TCP gastava ciclos (cópias de buffer).

      Isso exige que a aplicação e a NIC conversem diretamente. O ganho de performance é real — estamos falando de latências de leitura na casa dos 5µs a 10µs em redes locais. Porém, o custo desse "bypass" é a perda de visibilidade. Ferramentas padrão de observabilidade do Linux (como eBPF ou contadores TCP tradicionais) ficam cegas para o tráfego que não passa pela stack de rede do Kernel. Se algo quebra, você está depurando firmware de NIC, não software.

      Anatomia do Transporte: Zero-Copy do RoCE vs Stack TCP Moderno

      Para entender por que o TCP voltou à mesa de discussão em 2025, precisamos olhar para como os dados trafegam.

      O Caminho do RoCE (Otimização Extrema)

      No modelo RoCE, usamos Zero-Copy real. O comando NVMe é montado na memória do usuário e a NIC o lê via DMA (Direct Memory Access). Não há cópia de buffer, não há context switch, não há interrupções de CPU para cada pacote. É um tubo direto.

      O Caminho do TCP (A Evolução Silenciosa)

      Historicamente, o TCP era lento para armazenamento porque exigia múltiplas cópias de memória (User Space -> Kernel Buffer -> NIC). Isso queimava ciclos de CPU e aumentava a latência.

      No entanto, em 2025, o cenário mudou. Com a introdução de tecnologias como io_uring no Linux e o suporte generalizado a Zero-Copy send nas stacks TCP modernas, a diferença diminuiu drasticamente. Além disso, o offload de TCP em SmartNICs (DPUs) agora é onipresente. O "custo do TCP" foi terceirizado para o silício da placa de rede, mas mantendo a semântica robusta do protocolo.

      O Pesadelo Operacional do "Lossless Ethernet"

      Aqui é onde a maioria dos projetos falha. O RDMA foi desenhado para InfiniBand, uma rede que nunca perde pacotes. O Ethernet, por design, é "best effort" — se houver congestionamento, ele descarta pacotes. O RDMA odeia descarte de pacotes; a retransmissão destrói a performance.

      Para fazer o RoCE funcionar em Ethernet, inventaram o PFC (Priority Flow Control). É aqui que o pesadelo forense começa.

      O PFC permite que um switch diga ao vizinho: "Pare de mandar dados, estou cheio". Isso cria uma "pausa" na rede. Se mal configurado, isso gera o fenômeno de Congestion Spreading (Propagação de Congestionamento).

      O Custo Oculto do RoCE: Como o Flow Control (PFC) pode transformar um pico de tráfego em uma paralisação da rede. Figura: O Custo Oculto do RoCE: Como o Flow Control (PFC) pode transformar um pico de tráfego em uma paralisação da rede.

      Imagine um nó de armazenamento lento. Ele envia um Pause Frame para o switch. O switch, ficando cheio, envia um Pause Frame para todos os servidores conectados a ele. De repente, um banco de dados crítico para de responder porque um servidor de backup não relacionado saturou o link. Em uma investigação, isso aparece como uma "latência fantasma": a rede não mostra erros, apenas pausas.

      Como detectar Tempestades de PFC

      Se você opera RoCE, este comando é seu monitor cardíaco. Se os contadores estiverem subindo rapidamente, sua rede está parando, não fluindo.

      # Verificando estatísticas de Pause Frames na interface (ex: eth0)
      ethtool -S eth0 | grep -E 'pause|pfc'
      
      # Saída típica de um cenário problemático:
      # rx_pause_frames: 154023  <-- ALERTA: O switch está mandando parar
      # tx_pause_frames: 0
      # rx_pfc_frames: 23091     <-- ALERTA: Flow control prioritário ativo
      

      A Renascença do NVMe/TCP em 2025

      Por que lutar contra a rede se você pode usá-la? O NVMe/TCP aceita a natureza "suja" do Ethernet. Se um pacote cai, o TCP retransmite. Sim, a latência de cauda (p99) sobe momentaneamente, mas a conexão não colapsa e não trava switches vizinhos.

      Em 2025, três fatores trouxeram o TCP de volta ao topo da lista de decisão:

      1. Maturidade do Driver: O driver NVMe/TCP no kernel Linux (5.15+) é extremamente eficiente, utilizando poll queues dedicadas.

      2. Custo de Complexidade: Configurar DCB (Data Center Bridging), ECN (Explicit Congestion Notification) e PFC em switches de múltiplos vendors é propenso a erro humano. TCP funciona "out of the box".

      3. SmartNICs Acessíveis: Placas que fazem offload completo de NVMe/TCP agora custam frações do preço de soluções proprietárias de RDMA.

      Métricas que Importam: Latência de Cauda (p99) vs Throughput

      Não se deixe enganar por IOPS de folheto. Em armazenamento distribuído, a métrica rainha é a Latência de Cauda (Tail Latency).

      • Cenário Ideal (Lab): O RoCE vence. Latência média de 10µs contra 30µs do TCP.

      • Cenário Real (Congestionado): Quando o link satura, o RoCE depende do PFC. Se o PFC falhar ou causar head-of-line blocking, a latência de cauda dispara para segundos (ou timeout). O TCP, usando algoritmos de congestionamento modernos (como BBR), ajusta a janela e mantém o fluxo, talvez subindo para 200µs, mas nunca travando a rede.

      Para validar sua escolha, não use apenas dd. Use fio medindo os percentis altos.

      # Exemplo de teste de FIO focado em latência de cauda (p99)
      fio --name=lat_test --ioengine=libaio --direct=1 --rw=randread \
          --bs=4k --numjobs=1 --iodepth=1 --runtime=60 --time_based \
          --filename=/dev/nvme0n1 --group_reporting \
          --percentile_list=99:99.9:99.99
      

      Se o seu p99.99 no RoCE for instável sob carga, o "ganho" de latência média não vale o risco.

      Matriz de Decisão: RoCE vs NVMe/TCP

      Quando o custo operacional do RoCE paga a conta? Use esta tabela para guiar sua decisão arquitetural.

      Característica NVMe over RoCE (v2) NVMe over TCP
      Dependência de Rede Crítica. Exige switches com DCB/PFC/ECN configurados perfeitamente. Baixa. Funciona em qualquer infraestrutura Ethernet L3 padrão.
      Complexidade de Deploy Alta. Requer alinhamento entre times de Storage e Redes. Baixa. Plug-and-play na maioria das distros Linux modernas.
      Custo de Hardware Médio/Alto. Exige NICs compatíveis com RDMA e Switches Enterprise. Baixo/Médio. Roda em NICs padrão (melhor com SmartNICs).
      Performance (Latência) Excelente (<10µs adicionais). Muito Boa (<30µs adicionais com otimizações).
      Risco Operacional Alto. Risco de "Congestion Spreading" e paralisia da rede. Baixo. Isolamento de falhas nativo do protocolo TCP.
      Escalabilidade Limitada ao domínio de Layer 2 ou roteamento complexo. Infinita. Roteável globalmente como qualquer tráfego web.
      Caso de Uso Ideal HPC, AI Training Clusters, Bancos de Dados Oracle Exadata. Cloud Generalista, VMware vSAN, Kubernetes PVs, Edge.

      Veredito Técnico Investigativa

      Na minha experiência dissecando falhas, a complexidade é o inimigo da disponibilidade. O RoCE oferece uma Ferrari, mas exige uma pista de corrida perfeita (Lossless Ethernet). Se houver um buraco na pista, a Ferrari quebra. O NVMe/TCP é um veículo de rally: talvez não atinja a velocidade máxima teórica na reta, mas atravessa qualquer terreno sem parar.

      Para 95% das empresas em 2025, a "penalidade" de 20 microssegundos do NVMe/TCP é irrelevante comparada ao ganho de noites de sono sem alertas de PFC Storms. Reserve o RoCE para clusters de IA e HPC onde cada ciclo de CPU conta. Para todo o resto, o TCP venceu pela pragmática.

      Referências & Leitura Complementar

      1. NVM Express Base Specification 2.0: Seções sobre Transport Binding (TCP e RDMA).

      2. RFC 793 / RFC 8985: Protocolo TCP e o algoritmo RACK-TLP para recuperação de perdas (essencial para NVMe/TCP estável).

      3. RoCE v2 Annex (InfiniBand Trade Association): Detalhes sobre o encapsulamento UDP e requisitos de PFC.

      4. Linux Kernel Archives (Networking): Documentação sobre io_uring e Zero-Copy networking.

      #NVMe-oF #NVMe/TCP #RoCEv2 #Storage Networking #RDMA #Latência de Storage #100GbE
      Priya Patel

      Priya Patel

      Data Center Operations Lead

      Gerencia milhares de discos físicos. Sabe exatamente qual modelo de HDD vibra mais e qual SSD morre primeiro.